quarta-feira, 22 de abril de 2015

Bolas de gude podem ser o primeiro passo dos "mirolhas" na vida...







Em qualquer um grupo de crianças  havia sempre os mirolhas e os que não podiam ser mirolhas. 

Os deuses não concederam a eles esta suprema graça, baseados em critérios conhecidos apenas por eles.

Jogava-se bola de gude com três búlicas, três covas feitas com o calço do sapato, num chão de terra dura tão plano quanto possível.

Podiam jogar três ou mais jogadores , mas três era o número ideal. Para jogar , quando se decidia jogar, o mais rápido gritava “Marraio” e este grito garantia a ele om privilégio de ser o último a jogar.

Uma grande vantagem, pois o objetivo de todos era o de botar sua bola nas búlicas e impedir que os outros fizessem isto afastando as suas bolas para tão longe quanto possível.

O último a jogar, se fosse mirolha, podia botar a sua bola mais perto da búlica e acertar as bolas dos outros jogadores para que sumissem de vista.

O ganhador ficava com a bola dos perdedores, ganhava poder e notoriedade.

Quem ganhava mais eram os mirolhas, uma virtude que precisava ser exercida por um tipo especial de pessoa que tinham de se enquadrar nos 7 parâmetros abaixo:

1.       Tinha de ser rápido no raciocínio para gritar o marraio antes dos outros.

2.       Só gritar, porém, não adianta muito se você não soubesse como operar a sua bola e fazer a suas jogadas  sem um foco contínuo em ganhar o jogo.

3.       Ao jogar a sua bola não podia dar sinais de hesitação, pois esta atitude confiante sempre amedrontava os adversários inseguros e temerosos de perder suas bolas em poucas jogadas.

4.       Todo o gestual do jogador, obedecia uma coreografia não determinada, cuja a repetição segura dava ainda mais confiança aos melhores jogadores.

5.       O jogador mirolha tinha de ser impiedoso . Ao lançar a sua bola sempre que pudesse devia despedaçar com o impacto  a bola dos adversários.

6.       As bolas despedaçadas eram substituídas por novas bolas inteiras que cada um tinha em um saco de pano.

7.       Se perdesse o jogo seria esta a bola a ser entregue ao vencedor, a bola despedaçada ia  para o lixo.

O pensamento estratégico se tornava a segunda natureza dos bons jogadores. Mas cada estrategista destes, tinha de aprimorar a sua habilidade operacional. Cada lançamento ,  seguia uma coreografia. Um lançamento  jamais poderia ser feito com objetivo diferente da conquista da vitória.

O xadrez é o jogo mais antigo com mais jogadas, com milhões de jogadas posteriores, que os bons jogadores preveem antes de mover cada peão no tabuleiro.

Tanto na bola de gude quanto no xadrez o objetivo é a vitória incontentável com humilhação dos perdedores, mas sem bazófias dos ganhadores .

Quem ganha sempre será visto como um protegido dos deuses, pois este lugar nunca pode ser ocupado por alguém que ganhe a partida por acaso, por pura sorte.

Quem ganha não precisa se orgulhar muito da vitória, a vitória é para ele a mera consequência de seu jogo arrasador.

Há diferenças importantes nestes dois jogos que imitam a vida: 

a bola de gude para ser jogada requer de início apenas uma bola de gude por jogador, um área de terra dura, as três búlicas e pelo menos três jogadores disputando a vitória.

No xadrez não existe esta simplicidade: é preciso o tabuleiro, as peças , pelo menos dois jogadores  e o mínimo de interferência dos espectadores.  

Os jogadores devem ter um raciocínio matemático sofisticado e rápido como o que um desafiante num principado muçulmano que pediu,  diante de sua vitória sobre o campeão local , que o príncipe apenas lhe pagasse com grãos de trigo.

Colocando nos 64 quadrados do tabuleiro sempre o dobro dos grãos colocados no quadrado anterior.

O resultado em número de grãos é uma progressão geométrica simples.

O número 2 é multiplicado por ele próprio uma vez no primeiro quadrado e este resultado passa a ser  multiplicado pelo número anterior 64 vezes. Esta soma tem como fórmula


S= 2 elevado a 64ª potência – 1 .

O total é 18 446 744 073 709 551 616 – 1.

Se toda a terra recebesse uma plantação de trigo e fosse feita uma colheita por ano este  número só poderia ser alcançado em 450 séculos.

Este desafio ao príncipe foi feito por Lahur Sessa, o inventor do jogo de xadrez e o maior marqueteiro de seu produto, com um problema que atravessa milênios estarrecendo os menos relacionados a jogos matemáticos.

Jogadores de bolas de gude não têm esta capacidade de raciocínio. O que querem ganhar são as bolas de gude de seus adversários, nem pensam em grãos de trigo.

Em detrimento do jogo de xadrez em relação ao jogo da bola de gude há a definição de um pensador norte-americano : Quanto mais alguém joga xadrez mais capaz  se torna um jogador de xadrez.

 E para por aí.

Com a prática da bola de gude os mirolhas dão os primeiros passos de um futuro brilhante.

Se você tomar as 7 necessidades para se tornar um vencedor com a bola de gude e der a elas o tratamento dispensado a Sun Tzu em sua Arte da Guerra comprovará que quem seguir um ou outro, de Sun Tzu ao mirolha na bola de gude terá a mesma sabedoria filosófica, só que
os jogadores de bola de gude têm a vantagem da prática exercida nos primeiros anos de vida.

Joguei muita bola de gude, mas jamais me  considerei um mirolha, que pena...